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Crónica ICBAS News | agosto 2024

Mais oferta formativa regenerativa, por favor!

A revisão e constituição de novas ofertas formativas no âmbito da educação contínua no ICBAS têm tido uma dinâmica nunca antes vista. Mensalmente, são remetidas aos órgãos competentes da Escola múltiplas propostas, nascidas quer do (muito culpado) “Plano de Recuperação e Resiliência” (PRR) – através dos programas “Impulso Adultos” e, recentemente, “Impulso Mais Digital”; quer da identificação de necessidades de formação em áreas de especialização emergentes. E, por “defeito de formação”, não consigo, a cada nova proposta, deixar de tentar identificar o tipo de “cultura de qualidade” que justificou o impulso, mais ou menos consciente, de criar uma nova oferta formativa. No fim de cada ano, quando nos preparamos para fazer o reporte sobre a educação e formação do ICBAS, pergunto-me sempre: “estaremos a ser «regenerativos» que chegue?”

Sendo uma apaixonada pela Teoria Cultural (fundada a partir da visão da cultura de Raymond Williams, que acreditava que esta dependia de diferentes “Ways of life”, ou modos significativos de vida - estes, mais tarde complementados com um esquema de dimensões de grupo e de regulação, proposto por Mary Douglas, que se caracterizam pelo grau de liberdade de que cada ator dispõe, por um lado, para operar individualmente e, por outro, para controlar o seu próprio contexto social; e que estão na origem dos diferentes tipos-ideais de culturas de qualidade propostos por Lee Harvey e Bjørn Stensaker), não consigo deixar de analisar os diferentes processos educativos que passam pelos Serviços de Apoio à Formação à luz deste quadro teórico-conceptual. Este ajuda-nos a compreender que, dependendo do grau (forte ou fraco) de regulação (fatores essencialmente externos que influenciam os processos) e de grupo (fatores essencialmente relacionados com a coesão e capacidade de ação interna), estão na origem dos diferentes processos educativos, distintos “ways of life” e respetivos tipos-ideais de culturas de qualidade que os caracterizam (“way of life” fatalista = cultura de qualidade reativa; “way of life” individualista = cultura de qualidade reprodutiva; “way of life” hierárquico = cultura de qualidade responsiva; “way of life” igualitário = cultura de qualidade regenerativa).

Ora, todos estes “ways of life” ou tipos-ideais de culturas de qualidade convivem entre si nos diferentes processos educativos e mesmo dentro de cada processo propriamente dito, se analisado o seu ciclo de vida. Mas importará para esta reflexão pensarmos essencialmente nas motivações que impulsionam cada processo de criação de oferta formativa e, para que possamos focalizar a reflexão, olhar para o exemplo da oferta formativa não conferente de grau (educação contínua), tomando como exemplo a criação de formações no âmbito do PRR.

Conforme já referi, nos últimos anos, dispararam as novas ofertas de cursos e unidades de formação contínua, em particular enquadrados (originalmente ou durante o processo de criação) nos programas PRR. E se, numa fase inicial do projeto, a Escola se moveu por princípios de cultura de qualidade essencialmente (mas não só) responsiva (graus de grupo e de regulação fortes: os órgãos, departamentos e docentes apresentaram propostas de formação respondendo a um quadro normativo de financiamento e execução muito claro), a dinamização das diferentes propostas (quer as iniciais, quer aquelas que foram depois agregadas durante o processo de criação) permitiu-nos vislumbrar as vantagens de uma cultura de qualidade que se pretende mais regenerativa (grau de regulação fraco; grau de grupo forte). Isto é, a escuta ativa dos diferentes parceiros na co-definição de programas de formação (quer os parceiros académicos, que conferem às formações a inter e transdisciplinaridade que no ICBAS tanto valorizamos; quer aqueles com interesse na formação de quadros; quer mesmo aqueles que representam públicos-alvo), levam-nos a ter vontade de dedicar uma menor preocupação com o mero cumprimento das “metas” e das “métricas” da formação, favorecendo um genuíno interesse na definição de formações que, sendo amplamente participadas no processo de criação (e mesmo na sua operacionalização), se tornem particularmente cativantes, não só para os parceiros, que têm uma real oportunidade de participar na adequação da oferta às suas necessidades, mas também para a própria comunidade académica do ICBAS, porquanto estas formações se podem constituir como oportunidades únicas de desenvolvimento de novas temáticas de educação (e, quem sabe, de investigação) de interesse para uma comunidade que derruba os muros da Escola.

Reconhecemos que a oferta formativa continuará (e bem) a surgir de todas as diferentes motivações; e reconhecemos também que, para ser exequível, este “way of life” regenerativo requer maiores níveis de coesão estratégica interna dos diferentes órgãos e departamentos para a educação contínua, em detrimento de níveis de regulação externa aos quais, não podendo deixar de obedecer, temos que responder. Mas não será justamente esse o caminho para promovermos um catálogo de oferta formativa mais inovador, cativante e sustentável?

Imagem news

"Cirles in a Circle” de Wassily Kandinsky (1923) (1): personificação do contexto (o ICBAS no grande círculo e a sua oferta formativa nos círculos interiores, sendo que as cores poderiam perfeitamente representar as culturas de qualidade e as faixas que atravessam o círculo as entidades externas…); além disso, a interpretação do autor, que descreveu o quadro numa carta a uma outra artista, vai de alguma forma de encontro à ideia central desta reflexão: “The circle is the synthesis of the greatest oppositions. It combines the concentric and the eccentric in a single form, and in balance” (2). De que a oferta formativa do ICBAS deve ser, idealmente, uma forma única de cursos e culturas de qualidade concêntricas e excêntricas, em equilíbrio.

(1) Fonte: Philadelphia Museum of Art.

(2) Wassaly Kandinsky’s letter of 1931 in “Masterpieces from the Philadelphia Museum of Art: Impressionism and Modern Art (2007), p. 136.



Daniela Gomes
Coordenadora dos Serviços de Apoio à Formação do ICBAS

ICBAS, 30.AGO.2024
[Texto anexo à newsletter de agosto 2024]

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