Resumo (PT):
“A tradição não é necessariamente obsoleta nem é sinónimo de imobilismo. Além disso, não tem obrigatoriamente de ser antiga, mas pode muito bem ter sido constituída recentemente.” Hassan Fathy.
A tradição consiste na repetição de um gesto que, pelo seu significado simbólico, pelos recursos existentes ou por comprovada qualidade enquanto solução para um problema, assume relevância e assegura a sua permanência no tempo. De génese diversa e temporalidade variável, cada nova tradição soma-se a todas as outras suas precedentes e contemporâneas, traduzindo-se num palimpsesto, na acumulação e depuração do saber de gerações, em renovadas tradições.
Do “indígena” ao endógeno. No contexto colonial, a discussão em torno da condição do “indígena” percorreu um longo caminho até um recente reconhecimento, e valorização, da sua especificidade e dos seus conhecimentos endógenos. Ainda que a Política Ultramarina Portuguesa pudesse ser mais permeável às comunidades existentes em territórios colonizados que outras potências colonizadoras, e que sucessivas reestruturações e mudanças estratégicas na sua ideologia potenciassem a progressiva auto-determinação das populações, as condições para uma verdadeira emancipação reuniram-se apenas com a independência das novas Nações. Neste contexto de definição e construção da identidade colectiva, os conhecimentos endógenos assumem especial preponderância, sendo essencial buscar no património material e imaterial as raízes e ferramentas para um desenvolvimento integrado.
A arquitectura popular e informal São-tomense. No contexto de São Tomé, a arquitectura popular reflecte os diferentes ciclos económicos e estratégicos que marcaram o território. Nas suas estratégias de assentamento, na sua dispersão ou aglomeração, na escolha de locais e soluções construtivas, a espontaneidade da arquitectura popular reflecte as condicionantes a que foi sujeita e as necessidades a que tentou dar resposta, e os escassos registos das estruturas “indígenas” apontam algumas pistas para a interpretação da sua actual configuração. O território São-tomense, tal como a África contemporânea, herda referências do legado tradicional, das estratégias coloniais de assentamento e das inovações técnicas da ocidentalização, numa sobreposição de lógicas: o efémero confunde-se com o precário, o tradicional com o informal.
Resiliência e engenho nas soluções construtivas. Assim, as soluções construtivas adoptadas na auto-construção por comunidades rurais e urbanas São-tomenses constituem herança e adaptação de modelos de génese variada. Apesar da limitação de recursos, a recorrente elevação do solo (apoiando o espaço habitável em estacaria de madeira ou em pilares) ou a portabilidade das edificações (permitindo o desmonte e transporte para outro local) poderão apontar caminhos para a adaptação das construções populares às condições locais.
O potencial para o desenvolvimento. Neste seguimento, a investigação em curso pretende identificar potencialidades das iniciativas emergentes no território Santomense, incidindo nas áreas disciplinares de Arquitectura e Urbanismo, focando nas edificações espontâneas, na sua relação com o espaço colectivo e público, e na construção do território, tentando assim destacar características que possam contribuir para o desenvolvimento integrado, à escala local e global. O empreendedorismo individual e colectivo (o papel da auto-ajuda e da auto-construção como ferramentas de emancipação), o potencial da miscigenação (a versatilidade para assimilar e lidar com referências de origens diversas), a adaptabilidade ao clima e ao território, assim como o extenso potencial inexplorado dos materiais locais, constituem algumas das características em estudo na investigação em curso, que aqui se pretendem apresentar para discussão.
Abstract (EN):
“Tradition is not necessarily old-fashioned and is not synonymous with stagnation. Furthermore, a tradition need not date from long ago but may have begun quite recently.” Hassan Fathy.
Tradition consists in the repetition of a gesture that, due to its symbolic significance, existing resources or proven quality as a solution to a problem, has become relevant and ensures its permanence in time. Evolving from different origins and periods, each new tradition adds on to all its predecessors and contemporaries, resulting in a palimpsest, in the accumulation and depuration of transferred knowledge, into renewed traditions.
From the "indigenous" to the endogenous. Within the colonial context, the discussion over the status of the "natives" has come a long way to reach a recognition of dignity, specificity and endogenous knowledge. Although the Portuguese overseas policy might have been more permeable to existing communities in colonized territories than other colonial powers, and though successive restructuring and strategic changes in its ideology might have contributed to a progressive self-determination, the conditions for genuine emancipation were only met with the independence of the new nations. In this context of definition and construction of a collective identity, endogenous knowledge plays an especially important role, being essential to seek the roots and tools for an integrated development within the tangible and intangible heritage.
The Santomean vernacular and informal architecture. Within the context of São Tomé, vernacular architecture reflects the different economic and strategic cycles that took place in the territory. In its settlement strategies, in its dispersion or agglomeration, and in the choice of sites or construction solutions, the spontaneity of vernacular architecture reflects the constraints which it has been subject to, as well as the needs it has tried to respond to. The few records of "indigenous" structures suggest some clues for the interpretation of its current configuration. The Santomean territory, as most of the contemporary African continent, inherits the legacy of traditional references, of colonial settlement and technical strategies, as well as recent innovations of Westernization. Nowadays, all these influences overlap: the ephemeral is connected to poverty, and the traditional meets the informal.
Resilience and resourcefulness in building solutions. Thus, the constructive solutions adopted in self-construction by rural and urban communities in São Tomé are examples of adaptation, using references from diversified backgrounds. Despite their limited resources, the recurrent solution of elevation from the ground (supporting the dwelling space on wood posts or concrete pillars), or a portability of the buildings (allowing their dismantling and transportation to a different location) may point some traditional strategies of adjustment to local conditions.
The potential for development. Accordingly, ongoing research aims at identifying emergent potentialities within the territory of São Tomé, focusing on the investigation subjects of Architecture and Urbanism. By analysing traditional and informal constructions, their relationship with the public and collective space, as well as the construction of the territory, it tries to identify and highlight characteristics that may contribute to an integrated development, both at local and global levels. The individual and collective entrepreneurship (the role of self-help and self-construction as tools of emancipation), the potential of miscegenation (the versatility to assimilate and deal with references from different origins), the adaptability to climate and territory as well as the extensive potential of local materials, are some of the studied features that take part in the ongoing research, which are to be here presented for discussion.
Idioma:
Português
Tipo (Avaliação Docente):
Científica
Contacto:
alfernandes@arq.up.pt
Notas:
Disponível em vídeo através da TVU em http://tv.up.pt/videos/H8auKxiM.
Tipo de Licença: