Teresa Maria de Jesus Teixeira de Sousa
Tese de Doutoramento / Title: "A Hipertensão Causada por um Bloqueador dos Receptores da Adenosina.
Papel do Stresse Oxidativo."
Resumo / Abstract
Publicações realizadas no âmbito do Doutoramento / Publications related to the study conducing PhD Degree
Resumo
A hipertensão arterial é um dos principais problemas de saúde pública. No entanto, continuam por esclarecer os mecanismos fisiopatológicos subjacentes. O stresse oxidativo, que surge em consequência de alterações na produção e metabolismo das espécies reactivas de oxigénio, contribui para a génese e a progressão da hipertensão arterial. O sistema renina-angiotensina desempenha um papel fundamental na regulação da pressão arterial e da estrutura cardiovascular. Este sistema pressor pode contribuir para o desequilíbrio redox porque a angiotensina II (Ang II) estimula a actividade da enzima pró-oxidante NADPH oxídase, originando o acréscimo da biodisponibilidade de espécies reactivas de oxigénio, tais como o radical superóxido (O
2•-) e o peróxido de hidrogénio (H
2O
2).
A hipertensão arterial provocada pela infusão prolongada do antagonista não selectivo dos receptores da adenosina, 1,3-dipropil-8-sulfofenilxantina (DPSPX), é acompanhada por hipertrofia e hiperplasia cardiovascular, alterações da reactividade vascular e aumento da actividade da renina e dos valores de Ang II no plasma de ratos Wistar. A activação do sistema renina-angiotensina neste modelo é uma consequência do bloqueio da inibição exercida pela adenosina na libertação de renina e contribui para a elevação tensional e para as alterações da estrutura cardiovascular. Dada a relação entre Ang II e disfunção redox, o objectivo deste estudo foi esclarecer se o stresse oxidativo está envolvido na fisiopatologia deste modelo de hipertensão.
O DPSPX apresenta uma carga negativa em pH fisiológico e não consegue permear membranas celulares, o que limita as suas acções directas ao meio extracelular. Neste meio, o DPSPX pode exercer efeitos adversos não relacionados com o antagonismo dos receptores da adenosina. Um dos objectivos deste trabalho foi a avaliação dos efeitos directos do DPSPX sobre a xantina oxídase (XO) (enzima que participa no metabolismo das purinas e produz O
2•-, H
2O
2 e ácido úrico) e sobre o monóxido de azoto (
•NO) (importante vasodilatador endógeno sintetizado no endotélio). A XO e o
•NO têm distribuição extracelular, apresentam uma estrutura química susceptível de interacção com o DPSPX e desempenham importantes papéis na regulação cardiovascular. Verificou-se que este fármaco inibe a actividade da XO
in vitro e
in vivo. O decréscimo significativo das concentrações fisiológicas do antioxidante ácido úrico, originado pelo efeito inibitório na actividade da XO, pode acelerar a disfunção redox durante o período de infusão do DPSPX, contribuindo para a rápida instalação da hipertensão e das alterações tróficas vasculares. Apesar desta inibição reduzir também a produção de O
2•-e H
2O
2, não é previsível que este efeito atenue significativamente a subida da pressão arterial nos ratos tratados com DPSPX, dado que existem outras vias de produção destas espécies (NADPH oxídases) possivelmente mais relevantes neste modelo de hipertensão.
A elevação tensional, a disfunção endotelial e a hiperplasia vascular observadas nos ratos tratados com DPSPX podem, em parte, ser devidas à inactivação do
•NO por este fármaco. A interacção entre estes dois compostos foi avaliada
in vitro, tendo-se verificado que o DPSPX reduz a magnitude do sinal induzido pelo
•NO nos sistemas de detecção utilizados. Foi também avaliada a excreção urinária de nitratos+nitritos (NOx), um parâmetro frequentemente utilizado como indicador da biodisponibilidade do
•NO. Os ratos tratados com DPSPX apresentavam uma redução significativa das concentrações urinárias de NOx, durante o período de infusão do fármaco. Estes resultados estão de acordo com a interpretação de o DPSPX ser um captador do
•NO.
Numa segunda fase do estudo do stresse oxidativo neste modelo, foi efectuada a determinação da capacidade pró-oxidante e antioxidante plasmática e vascular. As alterações observadas no plasma dos ratos tratados com DPSPX, nomeadamente o aumento dos produtos de peroxidação lipídica e a diminuição da capacidade antioxidante total, traduzem a existência de stresse oxidativo. Na artéria mesentérica, a actividade da NADPH oxídase vascular estava significativamente aumentada. Este efeito era esperado porque a Ang II é um agente estimulante importante para a activação desta enzima. Por outro lado, o acréscimo marcado verificado na actividade da superóxido dismútase, da catalase e da glutationa peroxídase é indicativo de uma sobreprodução de H
2O
2.
Posteriormente, para avaliar se o stresse oxidativo contribuía para a génese da hipertensão, os animais foram tratados com compostos que reduzem a biodisponibilidade das espécies reactivas de oxigénio. Inicialmente foram testados os efeitos da apocinina e do tempol, dois agentes que diminuem os níveis de O
2•-. A apocinina reduz a produção de O
2•- por uma inibição selectiva da NADPH oxídase, enquanto que o tempol, um mimético da superóxido dismútase, converte o O
2•-•- em H
2O
2. Ambos os tratamentos reduziram a concentração de produtos de peroxidação lipídica no plasma dos animais infundidos com DPSPX. No entanto, só a apocinina conseguiu evitar a subida da pressão arterial e prevenir as alterações da estrutura vascular. Os animais tratados simultaneamente com DPSPX e tempol apresentaram um perfil de hipertensão e alterações hiperplásicas semelhante ao dos ratos que receberam só a infusão de DPSPX. Para além disso, a actividade da glutationa peroxídase na artéria mesentérica permaneceu elevada, traduzindo também uma produção aumentada de H
2O
2. Para confirmar a relevância fisiopatológica do H
2O
2 nestas circunstâncias experimentais, foi efectuada a administração diária de polietilenoglicol-catalase (PEG-catalase) a ratos tratados com DPSPX ou com DPSPX+tempol. O tratamento com a PEG-catalase preveniu a instalação da hipertensão e a proliferação das células musculares lisas vasculares nos ratos tratados com DPSPX e nos ratos tratados com DPSPX+tempol.
Em conclusão, a hipertensão causada pela infusão prolongada de DPSPX está associada a alterações redox sistémicas e vasculares, que traduzem a existência de stresse oxidativo. As acções directas deste fármaco sobre a XO e o
•NO podem acelerar a instalação da hipertensão por reduzirem, respectivamente, a concentração do antioxidante ácido úrico e do vasodilatador
•NO. Uma vez que a elevação tensional e a hiperplasia vascular são prevenidas pelo tratamento com apocinina ou PEG-catalase, parece razoável concluir que a activação da NADPH oxídase e o aumento da biodisponibilidade de H
2O
2 são factores fisiopatológicos relevantes neste modelo de hipertensão.
Abstract
Arterial hypertension is a major public health problem. However, the underlying pathophysiological pathways remain elusive. Oxidative stress is a deleterious condition that occurs when excessive reactive oxygen species (ROS) generation overwhelms the endogenous antioxidant defenses. Alterations in mechanisms responsible for ROS production and/or metabolism have been linked to the genesis and progression of cardiovascular dysfunction associated with hypertension. The renin-angiotensin system plays a pivotal role in the development and maintenance of hypertension and cardiovascular structural changes. It also contributes to oxidative stress, since angiotensin II (Ang II) stimulates the generation of ROS, such as superoxide (O
2•-) and hydrogen peroxide (H
2O
2), by activating NADPH oxidase.
The continuous infusion of 1,3-dipropyl-8-sulfophenylxanthine (DPSPX), a non-selective antagonist of A
1/A
2 adenosine receptors, for 7 days, induces hypertension, alterations in vascular reactivity, marked cardiovascular hypertrophy and hyperplasia and a significant rise in plasma renin activity and plasma Ang II levels. The blockade of adenosine brake on renin release is responsible for the activation of the renin-angiotensin system, which contributes to the blood pressure rise and cardiovascular structural changes in this model. Taking into account the relationship between Ang II and redox dysfunction, the aim of the present study was to evaluate the role of oxidative stress in DPSPX-induced hypertension.
When using drugs as tools to characterize pathophysiological processes we should also consider the putative direct effects of these drugs in such processes, besides its action as an agonists or antagonist. Interference with xanthine oxidase (XO) activity can result in an imbalance in antioxidant/oxidant production, either by increasing the production of ROS or by decreasing antioxidant defenses. Since DPSPX is a xanthine, an interaction with XO could be expected to occur. We evaluated the interaction between DPSPX and XO in order to ascertain its putative contribution to the hypertensive state and cardiovascular injury. We found that DPSPX is an inhibitor of XO. This was confirmed both
in vitro, by measuring the activity of XO in the presence of DPSPX, and
in vivo, by measuring the serum uric acid in rats treated with DPSPX. The significant decrease of uric acid, a potent antioxidant, may worsen the hypertension and the vascular injury in these rats. Although the inhibition of XO also leads to decreased O
2•- and H
2O
2 generation by this enzyme, it is not expected that this effect attenuates the blood pressure rise in DPSPX-treated rats as there are other sources of ROS likely to play a more relevant role in this model.
DPSPX may also react with
•NO, because it is negatively charged at physiological pH and contains a
p-sulfophenyl- group susceptible to interaction with this vasodilator. This scavenging effect was tested
in vitro. DPSPX was demonstrated to be a scavenger of
•NO in a concentration-dependent manner. Urinary nitrate+nitrite (NOx) excretion was also evaluated in DPSPX-treated rats as a marker for NO bioavailability. These animals had decreased levels of urinary NOx, which is accordance with our finding of an
•NO - scavenging effect by DPSPX. The inactivation of
•NO may contribute to the blood pressure rise, endothelial dysfunction and vascular hyperplasia observed in this model.
In the second part of the study, we evaluated the plasma and vascular pro-oxidant and antioxidant activities. Plasma levels of lipid peroxidation products were significantly increased, while the plasma antioxidant capacity was decreased, thus reflecting increased oxidative stress in DPSPX-treated rats. In the mesenteric artery, NADPH oxidase activity was increased by two-fold. This rise was expected since these rats have increased levels of plasma Ang II, which is a major stimulus for the activation of this enzyme. We also observed a significant increase in the activities of superoxide dismutase, catalase and glutathione peroxidase, pointing to increased vascular H
2O
2 generation.
Subsequently, to investigate if oxidative stress contributes to the genesis of DPSPX-induced hypertension, we examined the effects of prolonged administration of agents that reduce ROS bioavailability. To determine the role of NADPH oxidase and O
2•-, rats were treated with a NADPH oxidase inhibitor, apocynin or with a superoxide dismutase mimetic, tempol. To study the contribution of H
2O
22, rats were treated polyethylene glicol catalase (PEG-catalase) or with tempol plus PEG-catalase. Both tempol and apocynin prevented the DPSPX-induced rise in plasma lipid peroxidation products, but only apocynin prevented the increase in vascular glutathione peroxidase activity. Treatment with apocynin or PEG-catalase prevented the hypertension and vascular hyperplasia induced by DPSPX. Tempol failed to abolish the blood pressure rise and the proliferation of vascular smooth muscle cells, unless PEG-catalase was co-administered.
In conclusion, DPSPX-induced hypertension is associated with systemic and vascular changes in pro-oxidant and antioxidant status, reflecting sustained oxidative stress. DPSPX direct effects on XO and
•NO may accelerate the development of hypertension, as they lead to reduced bioavailability of uric acid and
•NO, respectively. Since the blood pressure rise and vascular hyperplasia are prevented by apocynin or PEG-catalase, it seems reasonable to assume that NADPH oxidase and H
2O
2 play important roles in the pathophysiology of this hypertension.
Publicações realizadas no âmbito do Doutoramento / Publications related to the study conducing PhD Degree
SOUSA, T., MORATO, M., FERNANDES, E., CARVALHO, F. & ALBINO-TEIXEIRA, A. (2004). Xanthine oxidase inhibition by 1,3-dipropyl-8-sulfophenylxanthine (DPSPX), an antagonist of adenosine receptors.
J Enzyme Inhib Med Chem, 19, 11-5.
SOUSA, T., MORATO, M., PINHO, D., FERNANDES, E., CARVALHO, F. & ALBINO-TEIXEIRA, A. (2004). Increased oxidative stress in mesenteric artery from hypertensive rats with activation of the renin-angiotensin system. In:
Proceedings of the 23rd Conference of Microcirculation, Eds Martins e Silva, J., Saldanha, C., Oliveira, V., Prie, A, Shore, A., pp 137-140. Monduzzi Editore, Medimond International Proceedings.
SOUSA, T., FERNANDES, E., NUNES, C., LARANJINHA, J., CARVALHO, F., PINHO, D., MORATO, M. & ALBINO-TEIXEIRA, A. (2005). Scavenging of nitric oxide by an antagonist of adenosine receptors.
J Pharm Pharmacology, 57, 399-404.
<--página anterior