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"Parecia totalmente descabido." Foi esta a reação dos matemáticos à descoberta de físicos nos anos 80, de uma correspondência clara entre certos invariantes vindos de geometrias muito diferentes num par de variedades de Calabi-Yau (CY) X e Y: a estrutura simplética de X e a estrutura complexa de Y. Essa dualidade é conhecida como simetria de espelho e X e Y são chamados um par espelho. Do ponto da matemática a simetria de espelho é ainda um fenómeno algo obscuro. A própria construção de exemplos desses pares é um problema difícil. Mas Strominger-Yau-Zaslow (SYZ) conjecturaram condições sob as quais duas CYs são um tal par. Um G-fibrado de Higgs numa curva algébrica é um par formado por um fibrado principal com uma secção (o campo de Higgs) de um fibrado vetorial associado. Introduzido por um dos geómetras mais influentes de nosso tempo, Nigel Hitchin, estes fibrados são cada vez mais centrais na matemática moderna. Os seus espaços moduli são variedades algébricas com geometria muito rica e conexões amplas, profundas e surpreendentes com outras áreas: teoria de gauge, quantização, geometria hyperkähler, sistemas integráveis, simetria de espelho, teoria de representação e de Teichmüller, teoria de Hodge ou o Programa de Langlands geométrico/clássico. Estes espaços foram cruciais no artigo de Ngo [27] sobre a teoria das formas automórficas e teoria dos números, que lhe deu a Medalha Fields. Espaços moduli de fibrados de Higgs são dos poucos exemplos que verificam as condições de SYZ. Para grupos de Lie complexos G, o sistema de Hitchin é dado pelo espaço moduli M(G) de G-fibrados de Higgs, com a aplicação própria de Hitchin h cujas fibras genéricas são subvariedades abelianas de Jacobianos de curvas espectrais. O par espelho de M(G) é o espaço moduli de G^L-fibrados de Higgs para o grupo dual de Langlands G^L de G. O objetivo deste projeto é estudar a geometria subjacente à simetria de espelho no sistema de Hitchin, usando Jacobianos/Pryms compactificada |
Summary
"Parecia totalmente descabido." Foi esta a reação dos matemáticos à descoberta de físicos nos anos 80, de uma correspondência clara entre certos invariantes vindos de geometrias muito diferentes num par de variedades de Calabi-Yau (CY) X e Y: a estrutura simplética de X e a estrutura complexa de Y. Essa dualidade é conhecida como simetria de espelho e X e Y são chamados um par espelho. Do ponto da matemática a simetria de espelho é ainda um fenómeno algo obscuro. A própria construção de exemplos desses pares é um problema difícil. Mas Strominger-Yau-Zaslow (SYZ) conjecturaram condições sob as quais duas CYs são um tal par. Um G-fibrado de Higgs numa curva algébrica é um par formado por um fibrado principal com uma secção (o campo de Higgs) de um fibrado vetorial associado. Introduzido por um dos geómetras mais influentes de nosso tempo, Nigel Hitchin, estes fibrados são cada vez mais centrais na matemática moderna. Os seus espaços moduli são variedades algébricas com geometria muito rica e conexões amplas, profundas e surpreendentes com outras áreas: teoria de gauge, quantização, geometria hyperkähler, sistemas integráveis, simetria de espelho, teoria de representação e de Teichmüller, teoria de Hodge ou o Programa de Langlands geométrico/clássico. Estes espaços foram cruciais no artigo de Ngo [27] sobre a teoria das formas automórficas e teoria dos números, que lhe deu a Medalha Fields. Espaços moduli de fibrados de Higgs são dos poucos exemplos que verificam as condições de SYZ. Para grupos de Lie complexos G, o sistema de Hitchin é dado pelo espaço moduli M(G) de G-fibrados de Higgs, com a aplicação própria de Hitchin h cujas fibras genéricas são subvariedades abelianas de Jacobianos de curvas espectrais. O par espelho de M(G) é o espaço moduli de G^L-fibrados de Higgs para o grupo dual de Langlands G^L de G. O objetivo deste projeto é estudar a geometria subjacente à simetria de espelho no sistema de Hitchin, usando Jacobianos/Pryms compactificadas, dualidade de branas, endoscopia geométrica, transferência, teoria de Hodge não-abeliana ou tropicalização. Várias destas interações são ainda territórios inexplorados. Sendo M(G) hyperkähler, podem-se definir branas BBB e BAA nesse espaço. Kapustin-Witten conjecturaram que tais branas são trocadas por simetria de espelho, via (extensões de) transformadas de Fourier-Mukai. Os exemplos conhecidos suportam a conjectura, mas estão no lugar suave (i.e. curvas espectrais suaves) do sistema de Hitchin. Contudo, o lugar singular (curvas espectrais singulares) foi pouco estudado, pelo que branas que o intersetam são de especial importância. Estudá-las requer lidar com Jacobianos/Pryms de curvas singulares, sendo este um objetivo: estudar Prym compactificadas de curvas singulares (reduzidas, mas irredutíveis ou não) e desenvolver transformadas de Fourier-Mukai nestas variedades. O estudo de Jacobianos/Pryms compactificadas de curvas redutíveis requer o uso de ferramentas combinatórias não triviais, logo estudaremos esses objetos do ponto de vista de geometria tropical. Esperamos construir espaços moduli de variedades Prym tropicais dentro da categoria de complexos de cones generalizados e usá-los para calcular parte da cohomologia do espaço moduli das curvas Prym. A cohomologia de branas de rank baixo encontradas em [32] (no lugar singular) será estudada, pois elas têm conexões profundas com simetria de espelho topológica e com a noção de fibrados de Higgs muito estáveis, logo com a geometria global dos espaços moduli de fibrados Higgs. Além disso, exploraremos as interações profundas que tais branas têm com certos mecanismos de matemática-física, como a endoscopia geométrica (a versão geométrica da noção de teoria de números de endoscopia, usada por Ngo) e o mecanismo denominado por transferência, envolvendo operadores de Wilson e Hecke. A simetria de espelho também será estudada do ponto de vista da teoria de Lie usando a aplicação global de Slodowy/Cayley, cuja imagem conjeturamos ser uma brana no espaço moduli de G-fibrados Higgs. Usaremos esta aplicação para estudar o mecanismo de transferência do ponto de vista da teoria de Lie e também a conjectura que relaciona BAA-branas vindas de fibrados de Higgs para formas reais com o chamado grupo de Nadler. Este estudo pode potencialmente descobrir relações entre simetria de espelho e teoria de Hodge não-abeliana, portanto, representações de grupos de superfície e estruturas geométricas. Embora mantendo a viabilidade das tarefas sob controle rígido, estes são aspetos potencialmente pioneiros do projeto, que abrem portas a verdadeiros avanços, e não meros incrementos, ao estado-da-arte. Um ponto central do projeto é a formação de estudantes e investigadores em geometria algébrica/diferencial. Esta área nuclear da matemática moderna necessita de desenvolvimento urgente em Portugal e este projeto contribuirá para esse objetivo. Por isso incluímos financiamento para bolsas de mestrado e pós-doutoramento. |