"Discretamente situado a cota inferior da alameda que margina a costa, o edifício é relativamente modesto na dimensão, implantando-se num rectângulo com trezentos metros quadrados. É também modesto na concepção arquitectónica fortemente influenciada por critérios estilísticos do século anterior, e sem rasgos na organização e qualificação do espaço interior que a natureza do programa suscitava. A um programa novo e a tecnologias também novas e já disponíveis na época, não correspondeu uma expressão arquitectónica moderna que se impunha e despontava já no País nos anos 20." [Estação de Zoologia Marítima "Dr. Augusto Nobre": Faculdade de Ciências. In "Os Edifícios da Universidade do Porto: Projectos". Porto: Universidade, 1987, p. 40-41].
A Estação de Zoologia Marítima foi criada em 1914 pelo Professor Augusto Nobre, iniciando-se quase de imediato as obras de construção do edifício, logo que ficou decidido que o local para a sua implantação seria próximo do Castelo do Queijo.
No início da sua actividade, a Estação dispôs de instalações muito reduzidas, sedeadas na Avenida de Montevideu, na Foz do Douro, onde, no entanto, cabiam diversos gabinetes de trabalho, dependências para alojamento de investigadores e ainda uma zona para exposição da fauna marítima. O facto de se situar junto à costa favorecia o cumprimento dos objectivos para que fora criada.
Em 1927, a Estação de Zoologia Marítima viu alargado o âmbito das suas actividades e, simultaneamente, as instalações que lhe estavam afectas. Durante esse ano foi construído um Aquário Público, composto por trinta e seis aquários para exposição de animais de água doce, salobra e salgada. O acesso ao tanque fazia-se a partir do corpo central do edifício. No interior deste também estava instalado um aquário de grandes dimensões, para animais mais corpulentos. Em seu torno havia outros, mais pequenos, para animais de água doce, e terrários para anfíbios.
Em meados do século, o número de visitantes da Estação de Zoologia Marítima aumentou comparativamente com os anos anteriores, mas o edifício começava a evidenciar fortes sinais de desgaste e a necessidade de obras de reparação:
"Urge (…) acudir ao edifício da Estação e, em particular, aos aquários expostos ao público, pois, apesar das importantes obras ali realizadas em 1945 pela Direcção dos Edifícios e Monumentos Nacionais do Norte, todo o edifício carece novamente de reparação importante, para a qual não é suficiente a verba da tabela orçamental do Instituto [de Zoologia Marítima], destinada à conservação do prédio. Esta verba (…) não permite mantê-lo em condições, em virtude da má exposição do mesmo, num local desabrigado, exposto à acção nefasta dos temporais e desgaste marítimo. Foram particularmente atingidos, agora, os referidos aquários, alguns dos quais ameaçam ruína e que urge reparar por completo, a fim de evitar qualquer desmoronamento de maior gravidade." [Anuário – Universidade do Porto. Porto. 6 (1951-1952)].
Em Julho de 1953 ficaram concluídas as obras de reparação e conservação levadas a cabo e retomou-se o repovoamento dos aquários da Estação [cf. Anuário – Universidade do Porto. Porto. 7 (1952-1953)]. Outras intervenções tiveram lugar mais tarde, no início dos anos 60, quer no Instituto de Zoologia Marítima, quer na Estação de Zoologia, apesar de se manterem as queixas quanto à insuficiência das instalações. Em 1961 chegou-se à conclusão de que já se poderiam realizar trabalhos de investigação nesta Estação.
A 10 de Janeiro de 1962, o Director do Instituto apresentou as bases para o projecto de construção de um novo edifício, mais amplo e com diversas funcionalidades. Previa-se que seria constituído por quatro secções conjuntas - uma de ensino, outra de investigação, outra de cultura popular e outra ainda de administração. A primeira disporia de um laboratório para aulas práticas, com capacidade para cinquenta alunos, um anfiteatro para aulas teóricas e conferências, uma sala de estar, um vestiário e instalações sanitárias. A segunda compreenderia doze gabinetes individuais, uma biblioteca, uma sala de colecções, uma sala para pequenos aquários de observações temporárias, diversos gabinetes – de fotografia, de taxidermia, de preparador, de analista, de naturalista –, uma série de laboratórios – de histologia, de bacteriologia e parasitologia, de bioquímica, de oceanografia, de fisiologia –, para além de outros espaços como uma sala para material, outra para reuniões do corpo científico, dez quartos para alojamento de investigadores, uma cozinha, um refeitório e instalações sanitárias. A secção de cultura popular deveria ser constituída por aquários de grandes dimensões – para exposição – e por pequenos aquários para fauna tropical, para além de um tanque de grande capacidade para adaptação e armazenagem dos exemplares colhidos. De início, a secção administrativa deveria ser composta por um gabinete para a direcção, por uma secretaria, uma residência para o guarda, uma garagem e uma casa para os barcos.
O local apontado para o novo imóvel situava-se a norte de Leça da Palmeira, pois apresentava a vantagem de aí haver reentrâncias abrigadas propícias a desembarques e de ainda não haver construções urbanas. Se esta zona não fosse viável, então o edifício seria construído no mesmo local onde se encontrava - Avenida de Montevideu -, de preferência junto a um cais acostável.
Entretanto, em 1965, o Aquário foi encerrado ao público devido a uma tempestade marítima que agravou as condições já muito deficientes das suas instalações. Os danos foram tão graves que foi necessário escorar a zona dos aquários. Perante esta nova situação pensou-se num imóvel construído de raiz. A preferência pelo local continuava a incidir no Parque de Cidade, então em projecto.
A 22 de Julho desse ano, o Ministro das Obras Públicas criou uma Comissão incumbida de decidir entre a remodelação e valorização das instalações existentes e a construção de novas, no mesmo ou em outro local. A escolha estava limitada pela verba disponível, não devendo ultrapassar a quantia de 1.500 contos, que correspondia ao valor da doação que iria ser feita pela Fundação Calouste Gulbenkian. Da Comissão faziam parte o Director dos Edifícios Nacionais do Norte, o Engenheiro Civil Mário Soares Lopes, que a presidiria, o Director do Instituto de Zoologia, Dr. Augusto Nobre, o Professor Amílcar Magalhães Mateus e o Director da Estação de Biologia Marítima do Ministério da Marinha, Doutor Herculano Vilela.
As démarches começaram pela caracterização do imóvel existente, que era constituído por dois pisos (rés-do-chão e "mansarda habitável"), pelos aquários exteriores a ele adossados, embora edificados num nível inferior e por cisternas de armazenamento de água do mar. Albergava diversos gabinetes e laboratórios destinados ao ensino e à investigação, uma sala central com um tanque e alguns pequenos aquários para exposição, compartimentos para arrecadação de utensílios de pesca e a habitação do guarda. Um grande senão devia-se ao facto de estar implantado em terreno irregular, dispor de uma área reduzida e situar-se num plano inferior ao da Avenida de Montevideu. O que significava não haver qualquer possibilidade de expansão para o lado nascente, o mesmo podendo afirmar-se para um eventual crescimento em altura.
Concluiu-se, ainda, que qualquer obra de remodelação, mesmo que limitada à área disponível, teria sempre de partir da demolição quase integral do imóvel existente, para se conseguir um outro que melhor se adaptasse ao fim pretendido. E mais uma vez se constatou que o edifício carecia de obras profundas. A cobertura dos aquários, formada por lajes de betão armado, encontrava-se em franca ruína, para além de apresentar desníveis e fendas extensíveis às paredes de apoio devido à proximidade do mar. De igual modo, as coberturas das cisternas encontravam-se muito degradadas e uma delas estava já em ruínas.
Face a estes elementos, a Comissão foi de parecer que a solução residia numa construção de raiz, apontando, de novo, a zona do futuro Parque da Cidade como sendo a localização ideal.
O Ministro das Obras Públicas, porém, não concedeu o aval necessário à concretização da Proposta que a Comissão lhe apresentou em 1967. O Relatório mereceu o seguinte despacho:
"Como estamos muito acima do limite [de numerário] (…) indicado, parece a priori condenada a hipótese de construção de novas instalações, sob pena de o Instituto ficar muito tempo pior servido do que actualmente. Não posso, porém, excluir, porque não conheço as instalações existentes, a hipótese figurada, pois pode acontecer que a sua precariedade ou a inconveniência do local não recomendem que se despendam quantias elevadas na sua beneficiação. Neste caso antevejo como solução a aplicação da importância disponível a um programa que se integre no plano das novas instalações e que tenha fraca utilidade em apoio e reforço das actuais, que se manteriam com o mínimo de trabalhos de beneficiação até poderem ser dispensadas, transferindo-se então inteiramente o Instituto para a sua nova casa. (…). A DGEMN [Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais] fará as diligências necessárias para este efeito e haverá que definir a orientação a seguir, dentre as duas que em princípio se possam oferecer: a) Remodelação e valorização das instalações actuais; b) Construção de novas instalações, no mesmo ou noutro local. Em ambos os casos há limite de despesas a observar (…) em vista das dificuldades do Tesouro na presente conjuntura. Poderemos fixar esse limite em 2.000 contos." [Despacho do Ministro das Obras Públicas exarado em 27 de Julho de 1965 no Relatório da Comissão nomeada para examinar os problemas de instalação da Estação de Zoologia Marítima do Instituto de Zoologia Dr. Augusto Nobre, da Universidade do Porto].
A 16 de Janeiro de 1966, o Director do Instituto de Zoologia Marítima Dr. Augusto Nobre, Professor Amílcar Mateus, informou o Reitor da Universidade do Porto de que piorara o estado ruinoso do edifício: "Um dos principais reservatórios da água, aquele que a fornece para os tanques, abriu brecha e caiu, por fim, um dos cunhais." De igual modo grave era o facto de o Instituto não dispor da verba necessária para a reparação, na ordem dos 15.000$00.
O mau tempo que se fez sentir por diversas vezes durante os invernos seguintes não permitiu abrandar nem a vigilância, nem o ritmo das obras de recuperação. A madrugada de 26 de Fevereiro de 1978 foi particularmente funesta:
"O mar, galgando as frágeis defesas daquele instituto, pôs fora de serviço o dique de protecção para as tomadas de água para os aquários, derrubou em quase toda a sua extensão o muro de protecção da casa do guarda e cerca de arame farpado que do lado sul impede a penetração de pessoal estranho e danificou em quase toda a sua extensão a cobertura dos tanques-aquários situados mais junto à praia." [Processo de obras de reparação dos danos causados pelo temporal de 25 para 26 de Fevereiro de 1978: Memória Descritiva. In Projectos de Obras, pasta 494 – Arquivo da Reitoria da U.Porto].
As arremetidas do mar durante o temporal que voltou a assolar a nossa costa exactamente um ano depois daquela calamidade acentuaram as marcas já mais do que evidentes de degradação e ruína. O levantamento dos estragos apontou a necessidade de trabalhos de restauro para que a utilização do edifício, ainda que em condições precárias, continuasse a ser possível: reparação de rebocos de paredes e tectos; pinturas em paredes com tinta vitrificante; execução de paredes de tijolo na zona do Aquário; colocação de vidros para substituição dos partidos; reparação de caixilhos, fechos e ferragens; reparação do quebra-mar e muros anexos.
Em 1981, a Junta de Freguesia de Nevogilde insurgiu-se contra o abandono a que sentia votado o "Aquário
Público Dr. Augusto Nobre":
"Na avenida de Montevideu, nesta Freguesia Litoral da cidade do Porto, foi construído nos anos 20 a Estação de Zoologia Marítima Dr. Augusto Nobre. Foi este Professor-Cientista da Faculdade de Ciências do Porto quem, alguns anos mais tarde, proporcionou à população portuense e de todo o Norte do país a possibilidade de dispor de um Aquário Público, o qual funcionou até 1963 sob gestão e direcção da estação de Zoologia Marítima (Faculdade de Ciências do Porto), à qual esteve adstrita desde sempre. Este equipamento (…) prestou os mais relevantes serviços à comunidade nortenha, seja nos aspectos cultural, recreativo, turístico, etc. seja no apoio aos alunos da Universidade do Porto. Bastará dar conta que no seu último ano de funcionamento (1963) o "Aquário" foi visitado por 30.000 pessoas (…). Um dia "fechou para obras" (…)! Acontece que 18 anos se passaram e o "Aquário" nunca mais abriu, degradando-se inevitavelmente (…). Esta Autarquia (…) inscreveu no seu plano de intenções o maior empenhamento em desbloquear tal situação, e ao fim de ano e meio de "luta" conseguiu sensibilizar a Faculdade de Ciências para a necessidade urgente de recuperar o "Aquário", tendo o Instituto de Zoologia Marítima Dr. Augusto Nobre conseguido que, através da Direcção-Geral das Construções Escolares, fossem feitos trabalhos de restauro no corpo principal e no terreno anexo da estação." [Aquário Público da Foz: Porto. In "Projectos de Obras, pasta 1.110 – Arquivo da Reitoria da U.Porto. Texto da autoria de Rogério Ferreira da Silva, Presidente Executivo da Junta de Freguesia de Nevogilde, datado de 25 de Setembro de 1981].
Em Novembro do mesmo ano já decorriam obras de reconstrução, levadas a cabo pela Direcção-Geral das Construções Escolares. De qualquer modo, depois de o Aquário ter encerrado ao público em 1965, apenas se manteve em funcionamento o edifício central da Estação de Zoologia Marítima, pois as obras de reparação que tiveram lugar posteriormente apenas permitiram adequar este estabelecimento às necessidades básicas do quotidiano.
Importa registar que, apesar de todas estas vicissitudes, o projecto inicial nunca foi alterado e que ainda hoje decorrem na Estação de Zoologia trabalhos práticos de Biologia, assim como trabalhos experimentais de futuros mestres e doutores da U.Porto.