Resumo: |
A psicopatia caracteriza-se por um conjunto de traços afectivos, interpessoais e comportamentais, como o desrespeito pelos direitos dos outros, mentira patológica, egocentrismo, ausência de empatia, violação de normas sociais e estilo comportamental anti-social [1]. Embora tenham sido descritos padrões anormais de funcionamento social em tarefas laboratoriais, estes dados são inconsistentes [2,3,PP4] e pouco compatíveis com os padrões comportamentais de indivíduos com psicopatia em contextos reais. De um modo geral, o estudo experimental dos padrões de interacção social na psicopatia através do uso de jogos económicos, como o Dilema do Prisioneiro (DP), tem demonstrado que a cooperação é a resposta predominante, mesmo para os participantes com psicopatia. Este dado, juntamente com as evidências do desempenho normal destes sujeitos em tarefas de cognição social [5], é inconsistente relativamente à demonstração de anomalias estruturais e funcionais em estruturas cerebrais envolvidas na cognição sociais em indivíduos com psicopatia [6]. A investigação prévia e actual desenvolvida no Laboratório de Neuropsicofisiologia sugere que estes indivíduos poderão apresentar défices na acomodação automática de informação emocional periférica. No presente projecto, assume-se que esta falha poderá estender-se ao automatismo dos processos envolvidos na cognição social, tais como a descodificação automática de expressões faciais de emoção, inferência de estados mentais, ou cooperação. Assume-se também que os indivíduos com psicopatia são capazes de produzir uma resposta comportamental social adequada, recorrendo contudo a processos neurocognitivos distintos. Esta proposta baseia-se numa abordagem de dois processos, em que o raciocínio estratégico e explícito (Tipo 2) é descrito como um processo que recorre à memória operatória, contrariamente aos processos implícitos (Tipo 1) [7]. Contudo, sugere-se que, ao prever o desempenho de sujeitos com psicopatia em tarefas de cognição soci |
Resumo A psicopatia caracteriza-se por um conjunto de traços afectivos, interpessoais e comportamentais, como o desrespeito pelos direitos dos outros, mentira patológica, egocentrismo, ausência de empatia, violação de normas sociais e estilo comportamental anti-social [1]. Embora tenham sido descritos padrões anormais de funcionamento social em tarefas laboratoriais, estes dados são inconsistentes [2,3,PP4] e pouco compatíveis com os padrões comportamentais de indivíduos com psicopatia em contextos reais. De um modo geral, o estudo experimental dos padrões de interacção social na psicopatia através do uso de jogos económicos, como o Dilema do Prisioneiro (DP), tem demonstrado que a cooperação é a resposta predominante, mesmo para os participantes com psicopatia. Este dado, juntamente com as evidências do desempenho normal destes sujeitos em tarefas de cognição social [5], é inconsistente relativamente à demonstração de anomalias estruturais e funcionais em estruturas cerebrais envolvidas na cognição sociais em indivíduos com psicopatia [6]. A investigação prévia e actual desenvolvida no Laboratório de Neuropsicofisiologia sugere que estes indivíduos poderão apresentar défices na acomodação automática de informação emocional periférica. No presente projecto, assume-se que esta falha poderá estender-se ao automatismo dos processos envolvidos na cognição social, tais como a descodificação automática de expressões faciais de emoção, inferência de estados mentais, ou cooperação. Assume-se também que os indivíduos com psicopatia são capazes de produzir uma resposta comportamental social adequada, recorrendo contudo a processos neurocognitivos distintos. Esta proposta baseia-se numa abordagem de dois processos, em que o raciocínio estratégico e explícito (Tipo 2) é descrito como um processo que recorre à memória operatória, contrariamente aos processos implícitos (Tipo 1) [7]. Contudo, sugere-se que, ao prever o desempenho de sujeitos com psicopatia em tarefas de cognição social, é necessário considerar a interacção entre processos de tipo 1 e 2. Neste modelo, estes tipos de processos podem conduzir à mesma resposta (interacção sinergética) ou podem competir para a produção de uma resposta (interacção antagonista). Neste quadro, considera-se que os participantes com psicopatia demonstrarão um processamento explícito e estratégico (tipo 2) em tarefas de cognição social, desde que estejam disponíveis recursos cognitivos suficientes. Assim, este projecto pretende testar um modelo interactivo de dois processos da cognição social, aplicado à psicopatia. Neste sentido, serão utilizadas duas versões do Jogo do Ultimato (JU) e manipulada a sinergia/antagonismo dos processos, impedindo-se participantes com índices baixos e elevados de psicopatia de utilizar processos de tipo 2 (através da saturação da memória operatória), ou forçando-os a usar estes processos (através de uma instrução de maximização dos ganhos). Serão analisadas as taxas de aceitação e rejeição de ofertas injustas. Adicionalmente, proceder-se-á a um registo EEG de alta-densidade (128 canais), sendo realizadas análises de tempo-frequência (oscilações) e no domínio temporal (potenciais relacionados com acontecimentos, ERP). Estes índices serão utilizados como correlatos da saturação da memória operatória e de esforço cognitivo enquanto os participantes consideram e respondem às ofertas. No geral, espera-se que a manipulação que força os processos de tipo 1 não tenha efeitos na rejeição de ofertas injustas pelos controlos, já que este constitui o seu modo de processamento "default". Pelo contrário, a manipulação que força o processamento estratégico de tipo 2 não produzirá efeitos comportamentais nos psicopatas. Nas análises tempo-frequência, espera-se os controlos apenas recorram a processos de tipo 2 na maximização de ganhos, apresentando um aumento de poder gama nesta condição, contrariamente aos psicopatas que utilizam sempre estes processos. Outros resultados electrofisiológicos poderão contribuir para clarificar as inconsistências existentes na literatura. No nosso conhecimento, este projecto constitui a primeira aplicação do JU ao estudo da psicopatia e a primeira análise de oscilações nesta tarefa. Além disso, descreve formalmente e testa a aplicação de um modelo interactivo de dois processos à cognição social e à psicopatia. Este modelo poderá ainda resolver algumas das inconsistências encontradas na investigação experimental da psicopatia. Uma contribuição final deste projecto será a adaptação para português de duas medidas de auto-relato da psicopatia: a Levenson Primary and Secondary Psychopathy scale (LPSP) [8] e a Psychopathic Personality Inventory - Revised (PPI-R) [9]. Estas escalas constituem importantes ferramentas de investigação, permitindo o recrutamento e avaliação em larga escala de participantes não forenses. |