Resumo (PT):
Nas últimas décadas, as perceções sobre a proteção social mudaram e as/os
beneficiárias/os têm vindo a ser acusadas/os pela comunicação social, políticas/os, e pelo
público em geral, de dependência, preguiça e até fraude. Esta perceção esteve também na
base das políticas sociais ativas, criadas no sentido de reforçar a responsabilidade social e a
‘autonomia’. A presente tese procurou desafiar alguns dos estereótipos, sobretudo os
relacionados com as mulheres pobres, demonstrando a singularidade dos seus percursos,
destacando as suas estratégias para escapar à pobreza e oferecer um futuro melhor aos seus
filhos, num contexto de desigualdade social.
O contributo teórico inovador deste trabalho assume-se na articulação de três abordagens
teóricas diferentes: estudos sobre igualdade, abordagem contextualista e disposicionalista de
Lahire, e teorias da intersecionalidade, de modo a registar os percursos singulares destas
mulheres, fazendo interseções entre o género, a maternidade, o estatuto socioeconómico e
a ‘raça’, de acordo com as dimensões da igualdade de condição, definidas por Baker e
Lynch: redistribuição, relacional, educação, representação, e respeito e reconhecimento.
Neste âmbito, foram elaborados sete retratos sociológicos, baseados em sessenta
entrevistas em profundidade, com vinte mulheres do Norte de Portugal. Foram ainda
estabelecidos contactos com organizações públicas e privadas e realizadas dez entrevistas
exploratórias, com dezassete informantes chave (profissionais de educação e ação social
que trabalham com beneficiárias/os do Rendimento Social de Inserção). Para a
interpretação dos retratos sociológicos, os percursos das mulheres foram divididos em
percursos esperados e inesperados (singulares).
Para além de uma evidente reprodução intergeracional da pobreza, caracterizada pela falta
de recursos económicos, a exclusão social das participantes mostrou estar profundamente
relacionada com desigualdades afetivas, tais como a negligência e a violência na infância, e a
violência doméstica nas famílias constituídas, com implicações a nível emocional,
económico, educativo e de saúde.
Contudo, apesar da desigualdade, as mulheres pobres mostraram ter estratégias para lidar
com os constrangimentos das suas vidas. A maioria das entrevistadas tinha definido uma
estratégia de mobilidade social ascendente, especialmente relacionada com o futuro dos
filhos, estando a sua agência fortemente relacionada com o cuidado e a priorização das
necessidades daqueles.
Esta investigação revelou ainda que o valor do rendimento social de inserção é claramente
insuficiente para as necessidades das famílias. De facto, este apoio permite apenas níveis de
sobrevivência, mantendo as mulheres entrevistadas num estado de dependência,
contrariando os objetivos de ‘autonomia’ delineados na origem daquela política social.
O estudo apresenta sugestões para o desenvolvimento de políticas nas áreas de justiça
social tais como a educação, o emprego, o apoio social, o cuidar, a habitação e a saúde. Em
suma, a perspetiva desta investigação destaca que a capacidade de planear, a motivação e a
possibilidade de ‘autonomia’ dependem em grande medida de condições socioeconómicas e
afetivas.
Idioma:
Inglês
Nº de páginas:
347